PREDITORES DE ATRASO NO DIAGNÓSTICO DE PACIENTES COM MIASTENIA GRAVIS NA BAHIA
Introdução: A miastenia gravis (MG) é uma doença autoimune da junção neuromuscular, heterogênea em apresentação clínica e sorológica, cuja incidência e prevalência vêm aumentando nas últimas décadas. Em contextos como o SUS — e particularmente na Bahia — persistem lacunas organizacionais ao longo da jornada assistencial (triagem na atenção primária, encaminhamento ao especialista, acesso à eletroneuromiografia), que podem postergar o diagnóstico e o início de terapias efetivas, com repercussões funcionais e psicossociais. Objetivo: Identificar fatores associados ao atraso no diagnóstico (≥ 12 meses entre início dos sintomas e confirmação) de pacientes portadores de MG. Métodos: Estudo transversal aninhado em coorte prospectiva (abr/2022–jun/2025) em dois centros terciários de Salvador-BA (HUPES-UFBA e Hospital Santa Izabel). Incluídos adultos com MG confirmada, avaliados por questionário padronizado. Variáveis: sociodemográficas; clínicas (fenótipo inicial, pior MGFA, sorologias anti-AChR/MuSK/LRP4, crise; comorbidades autoimunes e clínicas); funcionais (MG-ADL; MG-QoL15r); e de acesso/organização do cuidado (consulta com neurologista ≤ 1 mês; ENMG ≤ 6 meses). Análises bivariadas e regressão logística multivariada (stepwise por AIC), com checagem via LASSO. Resultados: Dos 83 pacientes, 30 (36,1%) apresentaram atraso diagnóstico. Grupos não diferiram em idade (p = 0,887), sexo (p = 0,568), cor/etnia (p = 0,201) e escolaridade/renda/situação laboral. Houve maior duração de doença no grupo com atraso (medianas 16 vs. 9 anos; p = 0,022). Avaliação precoce com neurologista (≤ 1 mês) foi muito menos frequente nos pacientes com atraso (6,7% vs. 52,9%; p < 0,001). Fenótipo inicial, pior MGFA, crise, terapias de resgate e sorologias não se associaram ao atraso. MG-ADL (medianas 6 vs. 3; p = 0,408) e MG-QoL15r (médias 14,7 vs. 11,3; p = 0,164) foram numericamente piores com atraso, sem significância bivariada. Comorbidades foram frequentes, porém sem diferenças entre os grupos (qualquer comorbidade: 53,8% vs 67,7%; p=0,310), e nenhuma condição específica (HAS, DM2, dislipidemia, depressão, tabagismo, outras) se associou ao atraso; doenças autoimunes associadas também foram semelhantes (21,6% vs 26,7%; p=0,802). Na multivariada, mantiveram associação independente: ausência de acesso precoce ao neurologista (OR = 9,22; IC95% 1,94–71,84; p = 0,012) e MG-ADL ≥ 6 (OR = 4,47; IC95% 1,13–20,61; p = 0,039); o LASSO corroborou (OR 10,49 e 4,49; p < 0,05). MGFA não se associou ao atraso. Conclusões: Em nosso contexto, o atraso diagnóstico em MG é frequente e vincula-se principalmente à ausência de acesso ao neurologista no primeiro mês de sintomas, e se associou a pior evolução funcional medida com MG-ADL. Os achados sustentam a necessidade de linhas de cuidado para triagem na atenção primária e encaminhamento precoce ao neurologista.


